Estrondos sem causa aparente assustam o mundo

domingo, 16 de junho de 2013


De repente, um grande estrondo quebra a calma do dia. A princípio, parece um trovão, mas o céu está limpo e azul como nunca. Essa é uma cena razoavelmente comum na Carolina do Norte, Estados Unidos, e poderia ser apenas um fato cotidiano e sem importância, não fosse a presença de muitos relatos semelhantes, provenientes de partes diferentes do mundo.

De acordo com o artigo “What’s that sound?”, publicado na revista New Scientist de 18 de fevereiro de 2012, há séculos esse tipo de fenômeno vem sendo testemunhado pelos seres humanos. Na região do lago Seneca, nos Estados Unidos, o evento misterioso ganhou o nome de Seneca guns; na cordilheiro dos Apeninos, na Itália, os barulhos são conhecidos como brontidi; e, no Japão, eles ganharam o apelido de yan. Já a Bélgica optou por uma expressão curiosa: mistpouffers, que em bom português quer dizer “arrotos do nevoeiro”.

Boa parte dos barulhos naturais que ouvimos possui uma explicação plausível, como tempestades ou o quebrar de ondas no mar. Porém, essas respostas parecem insuficientes para explicar os estrondos ouvidos na Carolina do Norte e em outros locais. Outra possível explicação seria a ação do ser humano sobre a Terra, mas o fenômeno também ocorre em locais afastados e longe de grandes centros.

Teorias demais, certezas de menos
Existem diversas ideias sobre a causa desses barulhos assombrosos. A primeira explicação que vem à mente de muitas pessoas são trovões, ou seja, rápidas expansões de ar causadas pelo aumento de calor e de pressão provocado pelos raios. Porém, a Carolina do Norte possui um clima calmo e as tempestades são raras.

Além disso, como reportado pela revista, o especialista em acústica da Universidade do Havaí, Milton Garces, afirma que o oceano também pode provocar barulhos muito curiosos por meio do impacto de uma onda com a superfície ou, então, pelo ar comprimido que pode ser expelido de dentro dela. Entretanto, esse tipo de evento também é percebido em locais afastados da costa.

Há também quem acredite que esses estrondos sejam causados por meteoros que sobrevivem à entrada na atmosfera terrestre. Como estão caindo à uma velocidade muito alta, é provável que produzam uma explosão sônica e que o rastro deixado por eles já tenha desaparecido quando o barulho chega aos ouvidos dos cidadãos locais. Mas, em entrevista para a New Scientist, o geofísico Michael Hedlin afirma que um evento como esse seria raro e, portanto, não condiz com as explosões ouvidas no período de alguns meses ou anos.

Outra possibilidade está na liberação e explosão de grandes quantidades de metano do fundo do mar. Porém, é muito pouco provável que esse gás seja liberado com a velocidade e quantidade ideal para que isso acontecesse. Alguns também culpam a presença de bases militares na região, mas a verdade é que os barulhos também são ouvidos a uma distância muito longe delas.

Eliminando todos esses suspeitos, ainda sobra um possível culpado por trás desse mistério: terremotos não detectados.

Quando a Terra resolve “falar”

De acordo com a New Scientist, a região da Carolina do Norte possui uma rede muito deficiente de sismógrafos e, por isso, vários terremotos pequenos podem passar despercebidos. David Hill, cientista emérito da Unites States Geological Survey (USGS), acredita que não são necessários grandes sismos para que um ruído enorme seja ouvido.


Terremotos menores acontecem o tempo todo, mesmo longe das fronteiras de placas tectônicas e, apesar de serem quase indetectáveis pelos sismógrafos, juntos esses sismos poderiam causar um estrondo capaz de ressoar superfície afora. Entretanto, não é fácil confirmar, com exatidão, que essa é a causa dos “trovões” da Carolina do Norte.


Quem já passou por um terremoto sabe o quão barulhenta pode ser a situação. Afinal, quando a crosta terrestre treme, tudo o que está sobre ela também balança: carros, edifícios, casas, prateleiras, mesas etc. Sendo assim, fica difícil saber qual é o som de um terremoto sem que construções e objetos interfiram nele.


Uma pessoa que chegou muito perto de saber como soa um sismo é um dos colegas de Hill, Malcom Johnston. Em 2008, enquanto estava a uma profundidade de 3,6 km, em uma mina de ouro sul-africana, Johnston presenciou um terremoto de magnitude 2 que se originou a 20 metros de distância dele. De imediato, ele ouviu um som que se parecia com uma sequencia de trovões, mas que também possuía ruídos de alta frequência sobrepostos.


Na superfície, a sensação é diferente, pois apenas as ondas de uma frequência muito baixa chegam até nós e, normalmente, elas não são percebidas pelo ouvido humano. Já as ondas audíveis e de comprimentos menores, de 20 hertz a 20 kilohertz, acabam sendo absorvidas e dispersadas pelas pedras atravessadas ao longo do caminho.


Clima e solo também influenciam

Hill acredita que o barulho de terremoto pode ser ouvido na superfície sob determinadas condições. Um sismo não muito profundo, por exemplo, pode aumentar as chances de que o ruído chegue até os ouvidos das pessoas. Além disso, a constituição do solo colabora para barrar ou não o estrondo: rochas como o granito, por exemplo, não dispersam tanto as ondas de som.

Caso o barulho encontre uma fenda, ele chega ainda mais facilmente à superfície, já que pode viajar sem obstáculos. Como se não bastasse, o clima também exerce influência sobre a propagação da onda. Uma camada de ar quente na atmosfera, por exemplo, pode fazer com que o som alcance distâncias ainda mais longas.


Mesmo assim, há quem duvide dessa possibilidade. Jonathan Lees, geofísico da Universidade da Carolina do Norte, afirma que os instrumentos usados para detectar terremotos são sensíveis demais e acredita que esses barulhos sejam causados por outro tipo de fenômeno natural.


Seja lá qual for a causa desses misteriosos estrondos, o fato é que, muitas vezes, temos atribuído à atividade humana um fenômeno que pode estar sendo causado pelo próprio planeta. Vamos torcer para que esse barulho todo não seja um grito de socorro da Terra.